A 
                            idéia do desenvolvimento de um projeto com 
                            esta temática remonta ao ano de 1998, quando, 
                            inocentemente, acreditávamos ser possível 
                            o estabelecimento de rede de coletores de informações 
                            em todos os municípios do Estado. Muitas conversas 
                            e argumentações entre a equipe, recém 
                            instalada no IEPA nos levaram, sabiamente, a adiar 
                            essa idéia, por considerarmos que a relação 
                            entre a abrangência temática e da área 
                            geográfica e o número de pesquisadores 
                            e técnicos envolvidos não seriam suficientes 
                            para dar cabo de tamanha responsabilidade.  
                           
                          A 
                            maturidade e o aprofundamento do conhecimento da realidade 
                            sócio-ambiental do Setor Costeiro Estuarino, 
                            obtidos através das atividades inerentes ao 
                            Programa Estadual de Gerenciamento Costeiro-GERCO 
                            permitiram a retomada dessa idéia, de forma 
                            concisa, como resultado do I Ciclo de Seminários 
                            sobre a Zona Costeira do Amapá, onde 
                            foram discutidos com as comunidades os resultados 
                            do Diagnóstico Sócio-Ambiental 
                            do Setor Costeiro Estuarino. 
                          A 
                            metodologia utilizada previu a realização 
                            de dois tipos de seminários com público 
                            alvo diferenciado: adultos e crianças entre 
                            9 a 12 anos de idade. O objetivo metodológico 
                            foi semelhante nos dois grupos, resguardando-se as 
                            diferenças do nível de compreensão 
                            das diferentes temáticas e buscou além 
                            da identificação dos problemas enfrentados 
                            pelas comunidades, as possíveis soluções 
                            e os agentes responsáveis pela solução 
                            dos problemas identificados. 
                         
                         
                          A 
                            gratificante surpresa foi perceber que as crianças 
                            têm um claro poder de entendimento e de consciência 
                            dos caminhos a serem percorridos para a solução 
                            dos problemas. Elas não terceirizam a responsabilidade 
                            pelos problemas, assumem-nos como ações 
                            a serem desenvolvidas também pelas comunidades, 
                            identificando as diversas formas de cooperação 
                            e de parcerias a serem efetivadas. 
                          Um 
                            exemplo claro é o da manutenção 
                            dos geradores que permitem a chegada de luz elétrica 
                            às comunidades. A Companhia Estadual 
                            de Energia Elétrica-CEA, ao instalar 
                            o “motor de luz”, faz um termo de cessão 
                            do equipamento e deixa claro que a responsabilidade 
                            pela manutenção do mesmo (conserto, 
                            abastecimento e etc...) é da comunidade. Em 
                            nenhum dos trinta e oito seminários realizados 
                            ouvimos os representantes de comunidades assumirem 
                            essa responsabilidade; o Estado é sempre colocado 
                            como o responsável. Os adultos não se 
                            reconhecem como co-responsáveis pelo seu próprio 
                            desenvolvimento e bem estar. As crianças, ao 
                            contrário, identificam a falta de responsabilidade 
                            da comunidade e definem como solução 
                            a “coleta entre os moradores” como forma 
                            da manutenção de tão importante 
                            equipamento. Outras atividades também demonstraram 
                            a importância da valorização e 
                            da necessidade do aprofundamento do conhecimento sobre 
                            a dinâmica sócio-ambiental junto as crianças, 
                            pois depende delas o futuro da região. Chamados 
                            a representar, através de desenhos a vida em 
                            suas comunidades, apenas um grupo retratou apenas 
                            o meio físico, sem a inserção 
                            do homem como parte da ecologia.  
                         
                         
                          Essas demonstrações levaram-nos a acreditar 
                          de que é possível estabelecer uma ligação 
                          forte entre conhecimento e co-responsabilidade. As crianças 
                          e pré-adolescentes são os clientes mais 
                          adaptados, sem preconceitos e sem vícios para 
                          a construção de seu próprio conhecimento. 
                          Aprender como funciona o ecossistema onde vive, a manutenção 
                          desse ecossistema e qual sua participação 
                          efetiva enquanto cidadão em formação 
                          é de suma importância na modificação 
                          de uma mentalidade predatória que se fortalece 
                          tanto mais quanto mais afastadas as comunidades estiverem 
                          da informação. 
                          Essas constatações levaram-nos a elaboração 
                          do projeto “Rede de Coletores de Informações 
                          Sócio-Ambientais:Jovens Pesquisadores do Arquipélago 
                          do Bailique”, atendendo ao Edital lançado 
                          em 2001 para o Programa Norte de Pós-Graduação-PNOPG. 
                          Para isso, considerou-se:  
                         
                          O costume secular de o caboclo sair para trabalhar e 
                          estender sua malhadeira de um lado ao outro 
                          do rio ou igarapé não o deixa perceber 
                          que esta atitude põe em risco o recurso pesqueiro 
                          que lhe serve de alimento. Embora ele já perceba 
                          que a produção é cada vez menor, 
                          não tem a noção exata do crescimento 
                          da população de pescadores que agora competem 
                          com ele nessa prática. De maneira mais cruel, 
                          o extrativismo vegetal dizima açaizais para a 
                          retirada do palmito, que não faz parte da dieta 
                          alimentar da população local, sem que 
                          se leve em conta que o vinho do açaí, 
                          além se ser mais nutritivo, é muito mais 
                          rentável economicamente. Nessa conjuntura, o 
                          acesso à informação é condição 
                          essencial ao bom exercício da cidadania, que 
                          será tanto mais efetivo, quanto mais o cidadão 
                          seja chamado a construir o seu conhecimento, vislumbrando 
                          as relações de causa e efeito de suas 
                          próprias atitudes na interação 
                          com o ambiente do qual faz parte. 
                        Através 
                          do Programa de Gerenciamento Costeiro-GERCO, o IEPA 
                          tem procurado estabelecer formas de monitorar alguns 
                          parâmetros que respondam satisfatoriamente a certas 
                          questões relativas à dinâmica ambiental 
                          do Arquipélago, integrando e beneficiando tanto 
                          este órgão de pesquisa como as escolas 
                          e outros segmentos da sociedade local.  
                         
                          O Diagnóstico Sócio-Ambiental realizado 
                          pelo GERCO (in press), demonstrou que, em vista das 
                          modificações ambientais de expressiva 
                          extensão ocorridas no Arquipélago nos 
                          últimos 30 anos, é de grande relevância 
                          o conhecimento da estrutura e do funcionamento dos ecossistemas 
                          locais, para que possamos oferecer alternativas técnicas 
                          para a melhoria da qualidade de vida das populações 
                          ribeirinhas.  
                        Desse 
                          modo, através da capacitação e 
                          do treinamento de estudantes da rede pública 
                          em procedimentos técnico-científicos, 
                          temos como objetivo central à formação 
                          de uma rede de coletores de informações 
                          sócio-ambientais, que terá como pano de 
                          fundo a valorização da capacidade de trabalho 
                          de membros da própria comunidade. Tal capacitação 
                          será feita de acordo com as características 
                          dos diferentes ecossistemas existentes no Arquipélago, 
                          abrangendo as diversas áreas do conhecimento 
                          relativo aos meios físico e biótico, assim 
                          como os diferentes aspectos da cultura local. 
                         
                          As atividades a serem desenvolvidas pelos jovens pesquisadores, 
                          apesar de variarem de acordo com a área em que 
                          eles venham a atuar, estarão fortemente fundadas 
                          na sensibilidade destes aos problemas de sua comunidade 
                          e na sua capacidade de percepção de fatos 
                          e fenômenos que interagem e interferem no objeto 
                          de estudo. 
                        A 
                          criação da rede será um incentivo 
                          aos alunos e moradores das comunidades a aprofundarem 
                          seus conhecimentos sobre o meio que os cerca, aguçando 
                          sua curiosidade sobre os processos bio-geo-químicos 
                          que ocorrem no arquipélago. A partir da análise 
                          dos dados de campo, esses processos serão correlacionados 
                          ao seu modo de vida, uma vez que estes têm reflexos 
                          inquestionáveis sobre as atividades socioeconômicas 
                          e culturais das comunidades, conforme pôde ser 
                          observado no I Ciclo de Seminários do Setor Costeiro 
                          Estuarino, do Programa GERCO/Amapá. A rede deverá 
                          gerar informações que poderão ser 
                          utilizadas em sala de aula, aproximando os conteúdos 
                          abordados da realidade vivida, cotidianamente, pelos 
                          estudantes.  
                         
                          Foram selecionadas, pela equipe interinstitucional e 
                          interdisciplinar que construiu esta proposta, nove escolas/comunidades 
                          para a execução do projeto. A Tabela abaixo 
                          mostra as características que foram determinantes 
                          na seleção das escolas/comunidades.  
                           
                         
                          
                             
                               
                                Escola/ 
                                Comunidade 
                                 | 
                                Características 
                                  Sócio-Ambientais  | 
                             
                             
                              |  Jaburuzinho | 
                               
                                Presença de siriubais; assoreamento da 
                                foz e erosão das margens do rio; ocorrência 
                                de pororoca; existência de agricultura de 
                                subsistência. | 
                             
                             
                              |   Livramento  | 
                               
                                Presença de siriubais e várzea; 
                                assoreamento da foz, erosão das margens 
                                do rio; reprodução e alimentação 
                                de aves migratórias; presença significativa 
                                de pulmonatas (uruás); belezas cênicas; 
                                existência de atividade artesanal e agricultura 
                                de subsistência. | 
                             
                             
                              |   Filadélfia  | 
                               
                                Região de campos e várzeas; aves 
                                migratórias; mortandade de peixes no início 
                                do inverno; agricultura de subsistência; 
                                atividade pecuária; beleza cênica. | 
                             
                             
                              |   Vila 
                                  Progresso  | 
                               Área 
                                de várzea; erosão das margens do 
                                rio; ocorrências arqueológicas; agricultura 
                                de subsistência; significativos investimentos 
                                em infra-estrutura; Escola Bosque e Hotel Escola 
                                Bosque (em construção). | 
                             
                             
                              |   Buritizal  | 
                               
                                Várzea; erosão; atividade extrativista 
                                (coleta de mel, óleo de andiroba, camarão); 
                                extração indiscriminada de palmito; 
                                agricultura de subsistência, aves e mamíferos; 
                                segunda comunidade mais antiga do Arquipélago 
                                artesanato; festa religiosa tradicional. | 
                             
                             
                              |   Freguesia  | 
                               
                                Várzea e siriubais; erosão das margens 
                                do rio; pororoca; agricultura de subsistência; 
                                comunidade mais antiga do Arquipélago; 
                                ocorrências arqueológicas. | 
                             
                             
                              |   Marinheiro 
                                   
                                  de Fora 
                                    | 
                               
                                Siriubais e várzea; região de pesca; 
                                assoreamento da foz e erosão das margens 
                                do rio; bovinocultura. | 
                             
                             
                              |   Foz 
                                  do Gurijuba  | 
                               
                                Várzea; erosão das margens e assoreamento 
                                da foz do rio; aves e mamíferos em geral; 
                                pecuária e agricultura. | 
                             
                             
                              |   Limão 
                                  do  
                                  Curuá 
                                    | 
                               
                                Arqueologia, erosão e deposição, 
                                várzea, atividade extrativista. | 
                             
                           
                          Essa 
                            seleção foi feita, basicamente, sobre 
                            dois critérios: 1) a existência de escolas 
                            da rede pública de ensino fundamental; e 2) 
                            a presença de problemas ou condições 
                            ambientais peculiares (físicas, bióticas 
                            e culturais), que necessitassem de conhecimento básico 
                            e/ou monitoramento. Na seleção da Vila 
                            Progresso, foi determinante a existência da 
                            Escola Bosque do Bailique com orientação 
                            pedagógica voltada para uma abordagem geo-educacional. 
                            Nas áreas escolhidas, são trabalhados 
                            parâmetros relacionados à: botânica 
                            e zoologia; hidrodinâmica, direção 
                            preferencial dos ventos, medidas de sedimento em suspensão, 
                            taxas de erosão e deposição e 
                            qualidade da água; noções de 
                            cartografia, etnobotânica, noções 
                            de arqueologia e resgate étnico-cultural. 
                         
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