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Fenômeno de revoada de besouros no município do Amapá em janeiro de 2024

 

Ocorreu um fenômeno biológico e histórico no município do Amapá, a 300 km ao norte da capital Macapá, durante os dias 7 e 8 de janeiro de 2024, em que houve revoadas de milhões de indivíduos de uma espécie de besouro, até então não registrada em literatura.

A espécie foi identificada como Dyscinetus dubius (Olivier, 1789) (Coleoptera: Scarabaeidae: Dynastinae), ocorrendo uma explosão populacional de tamanha grandeza que chamou a atenção da população local, da mídia e dos pesquisadores da área. Pôde ser notado que a quantidade é de fato surpreendente, possivelmente milhões de espécimes formando verdadeiras nuvens de besouros e vultuosos montes no chão abaixo das lâmpadas da iluminação pública e dos beirais das casas. A população fez diversos vídeos e fotografias demonstrando grandes quantidades de besouros, permitindo mergulhar pás manuais e até máquinas tratorizadas com caçamba carregadeira, além de toda a largura de algumas ruas (Figura 1). A espécie é nativa da América Latina e tem a sua ocorrência territorial denotada da Argentina ao México.

Figura 1 - Imagem à esquerda, besouro adulto da espécie Dyscinetus dubius (Coleoptera: Scarabaeidae: Dynastinae). À direita, aglomeração no ambiente urbano abaixo de fonte luminosa. Município do Amapá, 9 de janeiro de 2024. (Fotos de A.L. Jordão)

 

A espécie que realizou a revoada é D. dubius, também conhecida como catorra, bicho-bolo ou pão-de-galinha, nomes populares dados devido às carnosas larvas que são apetitosas às galinhas e a outras aves. É uma espécie inofensiva e causa nenhum mal à saúde humana ou à animal pois não são transmissores de doenças, nem mesmo de fitopatógenos. Exceto, se exposto aos olhos, à pele sensível ou como fitófago se alimentando de tecidos vegetais e causando dano econômico como praga de solo em plantas cultivadas, tais como gramíneas, arroz, milho, sorgo ou outras.

No campo, a postura é realizada no solo e aproximadamente uma semana depois eclodem as larvas que se alimentam do sistema radicular. Como característica geral dos escarabeídeos, a larva possui cabeça marrom, corpo de coloração branco-amarelada e curvadas em forma de “C”. Vive em galerias no solo a profundidade de 10 a 20 cm e ao se alimentar das raízes das plantas provocam diminuição da capacidade em absorver água e nutrientes, podendo afetar áreas de plantios comerciais.

Na região Amazônica, a última estação climática em 2023 passou por um período de estiagem severo, com secas prolongadas do ar, da vegetação e do solo. O verão teve temperaturas elevadas, além das frequentes queimadas que agravaram este cenário ambiental de seca. Porém, com o final deste período e já nos primeiros dias do ano de 2024, as chuvas finalmente vieram com a quantidade intensa característica do local.

A estiagem prolongada permitiu a disponibilização do sistema radicular em condição não inundada e assim a elevada oferta do alimento, havendo o desenvolvimento da grande quantidade de larvas que empuparam, geraram adultos e com a postura, novamente ovos para outro ciclo de ovo-larva-pupa-adulto. Aqueles inimigos naturais como anfíbios, aves, répteis e peixes que dependem ou são atraídos pela água foram impedidos de se alimentar do besouro ou catorra. Até mesmo possíveis fungos entomopatogênicos dependente de elevada umidade ficaram prejudicados durante este período. Portanto, somado a disponibilidade alimentar, a queda no acesso dos predadores e o clima favorável de elevada temperatura e baixa umidade, aponta-se como as razões da grande população do inseto e consequente revoada em enorme quantidade. Ademais as fontes luminosas com lâmpadas led brancas são bastante atraentes a insetos voadores.

O município do Amapá se localiza em área onde predomina paisagem plana e vegetação aquática (coordenadas geográficas 2o03’4,3” N, 50o48’1,3” O) com ambientes inundáveis em praticamente toda a área que circunda o perímetro urbano (Figura 2).

Figura 2: Imagem à esquerda, mapa do estado do Amapá, demonstrando o município do Amapá situado a leste na porção mediana. À direita, detalhe em que campos inundáveis circulam o perímetro do município. (Fotos em Google Maps).

Nas áreas inundáveis que circulam todo o ambiente urbano, ocorre em abundância a espécie vegetal conhecida popularmente como junco, Eleocharis mutata (L.) Roem. & Schult. (Cyperaceae). Na última estiagem, com a redução do nível de água, as raízes desta planta ficaram expostas em condição de sequeiro, permitindo a sua alimentação e o desenvolvimento do besouro D. dubius (Figura 3).

Figura 3 - Imagem à esquerda, aspecto da paisagem com a larga extensão do junco Eleocharis mutata. À direita, detalhe do crescimento do junco em campo inundado. Município do Amapá, 19 de fevereiro de 2024. (Fotos de A.L. Jordão)

 

Como sugestão, a massa dos besouros após a revoada poderia ser triturada e reutilizada em mistura à ração de peixes ou outro animal devido à fonte proteica das quitinas do exoesqueleto do corpo desse escarabeídeo ou utilizada em compostagem para posterior formação de adubo orgânico.


A partir do ocorrido, exemplares foram enviados para o IEPA – Instituto de Pesquisas Científicas e Tecnológicas do Estado do Amapá, indexados à Coleção Científica e compõe parte do acervo.


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Alexandre Luis Jordão, Engenheiro Agrônomo, Doutor em Entomologia
Pesquisador do IEPA – Instituto de Pesquisas Científicas e Tecnológicas do Estado do Amapá

Paschoal Coelho Grossi, Engenheiro Agrônomo, Doutor em Ciências Biológicas/Entomologia
Professor da UFRPE – Departamento de Agronomia, Recife Pernambuco


CNPQ   EMBRAPA        

 

 

 

 

 
 
 




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